quarta-feira, 2 de julho de 2014

Um certo modo de ser português


Ontem fui ao Planetário Calouste Gulbenkian, em Belém. Éramos oito: eu, a Sandra e a Susana, os netos Diogo e Francisco, a enteada Clarinha, mais o Alexandre e a Catarina, netos do Carlos e da Susana.
A sala estava quase cheia de crianças de escolas em visita de estudo e outras acompanhadas pelos pais ou avós. A sessão infantil começava às 14,30. Mas não começou. Durante mais quinze minutos foram entrando e entrando até que, finalmente, as portas fecharam-se. Um rapaz, de pé, na cabine de controlo, explicava em linguagem simples e apropriada o que iríamos ver nos próximos cinquenta minutos. Foi também repetindo avisos ou pedindo à infantil audiência para não conversarem enquanto decorria e exibição. Em vão. A cada imagem que aparecia no céu estrelado do Planetário seguiam-se os comentários das crianças e a reprimenda meio paternalista, meio portuguesa do rapaz do microfone, “pronto, vá lá… não conversem, não façam barulho…”
Mas o mais português acontecimento surgiu quando, passados pouco mais de dez minutos do início, o locutor interrompeu a narrativa de viagem dos astros e informou a audiência, “temos que interromper a sessão porque vamos deixar entrar uns meninos que se atrasaram…”
Acenderam-se as luzes, abriram-se as portas e lá entraram os meninos e mais os pais ou avós deles para ocupar os lugares vagos. Extraordinário foi o facto de não haver lugar para todos. Não há problema. Foram-se buscar cadeiras ao armazém, colocaram-se nas coxias e, “vamos recomeçar …” Houve mais alguns momentos de bulício entre a assistência seguidos pela voz cordata do rapaz, “pronto, vá lá…não conversem…pronto, vá lá…”
Bom, o importante é que as crianças gostaram e só nós, adultos e viajados, por nunca termos assistido a nada semelhante em situações similares, algures, notámos e comentámos esta faceta do modo de ser e estar dos lusos. Somos assim, complacentes, paternalistas, pouco rigorosos nos horários, facilitadores, desenrascados e possuidores demais características que nos marcam, para o bem e para o mal no relacionamento com os outros.

Pessoalmente, não renego nem me distancio desta atitude. A frieza do rigor em demasia é chata e desconfortável. A rigidez das normas e a inflexibilidade na sua aplicação pode ser o caminho mais correto no universo dos burocratas mas não contribui para a felicidade de ninguém. Somos um povo cheio de defeitos mas eu não gostaria de pertencer a outro.    

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